segunda-feira, 12 de julho de 2010

Seventeen - Someone from your childhood

       Jamais vou me esquecer de como me doeu chegar da escola e ver que já não tinha mais nada na sua casa. O portão pesadamente trancado, nenhum grunhido de cachorro, nenhum chororô do irmão mais novo, nem o cheiro das gostosuras da Tia Dulce. Para mim era previsivelmente uma decadência o meu amigo ter ido embora. A verdade é que quando somos amigos na infância, nada parece ser efêmero. Para nós tudo vai durar para sempre, não haverá rupturas ou mesmo perdas significativas. Eu poderia prosseguir com uma sentença nada boa do tipo "mas aconteceu algo de ruim". E está aí a quântica da nossa amizade: não aconteceu porque enfim era algo isento de bombardeios. E ainda o é.  Não é segredo pra ninguém o quanto eu gosto da minha infância. Ela me construiu demais e ainda hoje é preciso que por vezes eu retroceda a ela para poder resolver algumas pendências. E me orgulho de muitas vezes me espelhar em você, Jhone. Sabe o que eu não esqueço também? A forma como nos conhecemos. Eu sendo um encrenqueiro de primeira com minha gangue pré-adolescente e você sendo o garoto introspecto que olhava as brincadeiras com um ar de "passei-dessa-fase" que me irritava profundamente. E lá foi eu caçar briga com o novato, afinal  alguém estava ameaçando o meu território. Você me olhou com aquela cara de inquisidor, pegou na mão de seu irmão menor e disse: "Me recuso". Nossa, como a petulância daquele carinha me irritou... Mas quando eu descobri que ele morava na casa onde tinha a goiabeira que produzia as melhores goiabas do bairro a história mudou. Não demorou muito tempo pra que virássemos amigos. O que antes se dividia no Garoto das Histórias Estranhas e no Garoto Mais Calado do Bairro, somou-se nos Carinhas Estranhos Metidos a Bruxos.
     Ah, e como eu adorava aquilo... Jamais vou me esquecer das sociedades formadas. A primeiríssima: A.A.A - Associação Alternativa dos Alquimistas. Deus do céu! Como é que a gente não criou a fórmula da bomba atômica? Ainda hoje eu me pergunto... Era cada mistura que até eu me impressionava. Lembre-se também dos nomes pitorescos de cada poção: Repugnus, Sangue de Dragão, Lágrima de Duende, Choro Indolente, Encanto Profundo e por aí vai...  Pois é, não deu muito certo, as poções exigiam um herbário completo e logo, logo nossas mães ficaram com medo de estarmos mexendo com drogas... E então veio a Sociedade Potteriana. Dedicada a mentes ávidas pelo universo de Harry Potter com toda a sua gama diversificada de vertentes mágicas. Acho que essa sociedade nunca acabou por assim dizer. Mais tarde ganhou nova roupagem - a W.O.N (Witches of Night). A essa altura só nós resistimos porque o resto do bairro nos olhava com tochas e forcados. A Brigada Paternamente Inquisitorial nos caçava enquanto todos os pais do bairro nos proibiam de falar com seus indefesos filhos! A diferença sempre nos botou um pouco de escanteio, socialmente falando. Éramos zoados, tachados, mas nos víamos como algo sólido demais pra ser abalado. E sempre houve os valentões que queriam bradar sua supremacia. Eu, sempre encrenqueiro, partia pra cima, mas no final me valia da astúcia e da rapidez tão aliada a franzinês  que até hoje permanece em mim. Você se valia da inteligência e sempre sumia, seu mala!  Era tão mais fácil não é? Quando enfim nos julgávamos fora de perigo ao ver os valentões se afastarem era só subir na goiabeira, invocar as forças de não-sei-daonde e desejar com força que eles acordassem com catapora, urticária ou varicose. Ou então era só gritar o nome da doença bem alto e apontar pro infame desafortunado. Nem sei se alguma vez esses feitiços ilusórios de última hora deram certo, mas que era super engraçado pensar nos valentões prostrados e cheios de brotoejas , isso era! E era essa a verdadeira magia que sempre procurávamos nas histórias, nas brincadeiras ou engenhocas feitas de álcool, ervas e gel de cabelo. 
      Foram alguns anos crescendo juntos, brigando, jurando que nunca mais íamos nos falar e logo depois arrumando um jeito de arruinar a fama do valentão da esquina. Vou sempre me lembrar com muita saudade dessa época em que tudo se resumia a magia e pensar no futuro era algo tão fora de rotina... Você nunca foi realmente embora. Lembra do que eu te falei? Eu disse bem triste: "Em qualquer lugar onde se possa fazer magia, onde se possa ver o mistério eu já vou estar contigo. Se você ficar com medo não se esquece: é só apontar a varinha (que era um palito de churrasco) e gritar o nome de uma doença bem nojenta!".
          Por isso agradeço por tudo, meu grande irmão. Você jamais partirá.

"Se amizade construísse casas, a nossa era mais do que Hogwarts."

Mal-feito, feito!

Nox.

3 pessoas se inspiraram:

Adam Andrews disse...

Oun *-* Super!!!!!
asheua' eu ri muito, tu viveu uma infancia otima!Espero que o teu presente e futuro sejam bons e divertidos!

Jhone Roberto G. Santos disse...

Caraca!!! Como é bom relembrar a infância. Foi tudo isso e mais um pouco, mesmo. Foi incrível!!!Foi único.. e para sempre será.

Saudades Amigo.

Anônimo disse...

Cara , eu quase morri de rir ! Sua infância foi ótima , patrocinada por ninguém menos que Harry Potter ! E eu vi a goiabeira no seu texto !!! Goiaba é minha fruta favorita, e as goiabeiras são simplesmente as melhores para subir !
Estou fazendo o possível para preservar a minha infância o máximo que eu puder , porque eu tenho um lema: pra ser adulto a gente tem a vida toda ; mas pra ser criança , só há UMA oportunidade .
Que bom que você se sentiu emocionado com meu texto , porque eu também me senti com o seu . E que bom que eu não sou a única criança esquisita do mundo !! ;D
Brincadeiriinha .
E sobre minha forma de escrever ... eu nunca sei que idade eu tenho , afinal . São diferentes a cada momento .
Beeijos , e obrigada pelo carinho (: